O POTENCIAL OLIMPICO BRASILEIRO
Dando continuidade ao tema da última edição, sobre os Jogos Olímpicos no Brasil, neste mês conversamos com o Professor Doutor Antônio Carlos Simões, coordenador do Laboratório de Psicossociologia do Esporte, da EEFEUSP e membro da comissão técnica da seleção brasileira de Handball nos Jogos Olímpicos de Barcelona. A conversa caracterizou-se fundamentalmente pela discussão a respeito das condições que o nosso país possui atualmente e quais são as perspectivas reais em relação ao nosso desempenho em 2016, em função dos aspectos infraestruturais e organizacionais.
A seguir, discorreremos sobre os principais assuntos abordados. É fato que o Brasil, pelo menos ainda, não é uma nação olímpica. Discursos que conferem ao país este título deixam frouxidão nos processos de análise das nossas condições. Ainda não possuímos estruturas reais para receber o evento. Segundo o Professor, não se constrói ou não se tem um alto desenvolvimento, por exemplo, de atletas de elite, em seis anos, isto leva décadas de aprimoramento estrutural e humano. O país não possui centros de treinamento de alta qualidade em números consideráveis, com algumas raras exceções.
Em termos estruturais, a cidade do Rio de Janeiro pode e deve ser melhorada. Já temos a experiência dos Jogos Panamericanos, onde muitos erros ocorreram e agora estes devem ser levados em conta nos novos projetos.
Precisamos de políticas bem desenvolvidas em termos de definição de padrões de organização, canais de comunicação, métodos, procedimentos, entre outras ações. No que concerne à formação de recursos humanos na área esportiva, o Brasil também não possui uma sistematização direcionada ao processo de formação de treinadores. Temos que reconhecer que a ciênciavem ganhando lugar no mundo esportivo como um todo, no entanto, a tradicional política do exatleta em cargos de grande importância continua presente.
Simões nos conta que em países que são de fato uma potência olímpica, nenhum treinador, de qualquer modalidade que seja, pode dirigir uma equipe nacional sem ter passado por uma escola específica de formação, ainda que este tenha sido um expoente na modalidade durante sua carreira de atleta, exemplos são os centros de excelência na formação de treinadores na Alemanha ou o sistema de formação de técnicos da federação inglesa de futebol. Nestes países o trabalho de base é realizado apenas por pessoas certificadas por centros de formação; o trabalho com crianças, adolescentes e jovens é altamente complexo e exige conhecimento profundo. É claro que a pró-atividade, a facilidade no relacionamento com este público e a paixão pelo esporte são pré-requisitos, porém eles são inerentes. O conhecimento científico-metodológico deve ser o carro-chefe dentro deste processo, tais qualidades só se fazem eficazes quando acompanhadas da instrução correta.
O que o país precisa então para ser o que almeja naquilo que se relaciona à formação de profissionais formadores de atletas? Simões nos explica que a graduação comum na área de Esporte ou Educação Física é sim um pré-requisito para o cargo de treinador, no entanto, não é suficiente. Centros de excelência na formação de treinadores para modalidades específicas seriam uma saída para o desenvolvimento eficiente de atletas olímpicos.
Cada modalidade apresenta um amplo repertório motor único e complexo, o qual para ser contemplado plenamente exige de fato muito conhecimento científico e dedicação única. O Professor aponta que se observarmos os casos de sucesso em algumas modalidades específicas como a natação, por exemplo, os atletas brasileiros que se destacam em jogos olímpicos passam por modelos internacionais de treinamento, como é o caso de Cesar Cielo, da natação, que treinou nos Estados Unidos da América, isso em função da escassez de centros nacionais de alta qualidade e que atendam os atletas desta modalidade.
Além da necessidade de desenvolvimento infraestrutural, portanto, o que é mais simples de se observar a olhos nus; precisamos de recursos humanos especializados. Nosso costume e visões imediatistas não resolverão nossas dificuldades em “produzir” atletas olímpicos.
Modalidades singulares como o vôlei ou o futebol são casos à parte; os Jogos Olímpicos são compostos por diversas práticas, e estas demandam um sistema de organização específico. A articulação entre as diferentes esferas do governo – municipal, estadual e federal – é fundamental para o desenvolvimento de modalidades não populares no país, que em contrapartida são fontes de inúmeras medalhas para nações olímpicas. Projetos de centros de formação, tanto de atletas, como de treinadores, são dependentes de uma “função” entre estas esferas.
Ao indagarmos o Professor Simões sobre providências que a comunidade acadêmica poderia tomar para que as necessidades de um projeto olímpico sejam contempladas, ele nos responde que, primeiramente devemos ganhar proximidade do governo, não importando qual seja o canal de comunicação. O Ministério do Esporte deve prestar contas à população em relação ao desenvolvimento de projetos e sua implementação. A comunidade acadêmica possui a instrução necessária para acompanhá-los de perto e avaliar se o caminho está sendo trilhado da melhor forma. O conhecimento específico concernente ao desenvolvimento das competências física, técnica, tática e emocional de um atleta ou de uma equipe compõe nossas ferramentas de trabalho, além é claro das informações que possuímos em termos organizacionais.
Nas palavras do professor: “Nossa função é cobrar. Do contrário continuaremos deixando todo o trabalho por parte do Comitê Olímpico e das confederações. Teremos então aquele número insignificante de medalhas; os Jogos irão passar, e qual será o legado que teremos? Convites feitos aos membros do governo para vir à Universidade e nos contar como anda o projeto olímpico, assim como quem são os responsáveis pela sua execução e como se desenvolve a política do Esporte no Brasil são possíveis meios de nos inserirmos na história destes Jogos”.
Quem é do Esporte ou da Educação Física deve liderar os movimentos ligados a este fenômeno no nosso país; responsabilidade profissional em caráter público é algo que ainda precisamos aprender, e se já aprendemos, devemos então iniciar a intervenção. O Brasil ainda é dependente de estruturações de base; é praticamente uma certeza que gastaremos bilhões de reais provenientes do dinheiro público na corrida para a preparação inevitavelmente “às pressas” para os Jogos. Por que todo este investimento não é direcionado a aspectos que devem receber as primeiras atenções de qualquer país que pense conscientemente no futuro olímpico? Já temos escolas suficientes? Já temos políticas administrativas que prezem a formação de atletas olímpicos e que lhes dêem suporte para chegar ao pódio? Já temos diversos centros de excelência nas mais tradicionais modalidades olímpicas?
Infelizmente este é o nosso cenário real. O que nos cabe, talvez, seja atuar de forma responsável e consciente para fazer com que tudo que se encontra dentro das possibilidades do tempo e das condições presentes seja realmente feito. Por enquanto, o Brasil é apenas – desde que haja responsabilidade e iniciativa – uma potencial nação olímpica.
O PETELECO agradece a importante e enriquecedora conversa com o Professor Antônio Carlos Simões.
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