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O POTENCIAL OLIMPICO BRASILEIRO

(Rafael Alan Lopes)

 

 

Dando  continuidade  ao tema  da  última  edição,  sobre  os Jogos Olímpicos no Brasil, neste mês  conversamos  com  o  Professor  Doutor  Antônio  Carlos  Simões,  coordenador  do Laboratório de Psicossociologia do Esporte,  da  EEFEUSP  e  membro  da comissão  técnica da  seleção  brasileira  de  Handball  nos  Jogos Olímpicos de Barcelona. A  conversa  caracterizou-se  fundamentalmente  pela discussão  a  respeito  das  condições  que  o  nosso  país  possui atualmente  e  quais  são  as  perspectivas reais em  relação ao nosso  desempenho  em  2016,  em função  dos  aspectos  infraestruturais  e  organizacionais.

A seguir,  discorreremos  sobre  os principais assuntos abordados.  É  fato  que  o  Brasil, pelo  menos  ainda,  não  é  uma nação  olímpica.  Discursos  que conferem  ao  país  este  título  deixam  frouxidão  nos  processos  de análise  das  nossas  condições. Ainda  não  possuímos  estruturas reais  para  receber  o  evento.  Segundo  o  Professor,  não  se  constrói ou não se tem um alto desenvolvimento,  por  exemplo,  de atletas de elite, em seis anos, isto leva  décadas  de  aprimoramento estrutural  e  humano. O  país  não possui centros de  treinamento de alta qualidade em números consideráveis,  com  algumas  raras exceções.

Em  termos  estruturais, a cidade do Rio de Janeiro pode e deve  ser  melhorada.  Já  temos  a experiência dos  Jogos Panamericanos, onde muitos erros ocorreram e agora estes devem ser levados em conta nos novos projetos.

Precisamos  de  políticas  bem desenvolvidas  em  termos  de definição de padrões de organização,  canais  de  comunicação, métodos,  procedimentos,  entre outras  ações. No que  concerne  à formação  de  recursos  humanos na  área  esportiva,  o  Brasil  também não possui uma sistematização  direcionada  ao  processo  de formação  de  treinadores.  Temos que reconhecer  que  a  ciênciavem  ganhando  lugar  no  mundo esportivo  como  um  todo,  no  entanto, a tradicional política do exatleta  em  cargos  de  grande  importância continua presente.

Simões  nos  conta  que em  países  que  são  de  fato  uma potência   olímpica, nenhum  treinador,  de  qualquer  modalidade que seja, pode dirigir uma equipe nacional sem ter passado por uma escola  específica  de  formação, ainda  que  este  tenha  sido  um expoente  na  modalidade  durante sua  carreira  de  atleta,  exemplos são  os  centros  de  excelência  na formação  de  treinadores  na Alemanha ou o sistema de formação de  técnicos  da  federação  inglesa de futebol. Nestes países o trabalho  de  base  é  realizado  apenas por pessoas  certificadas por  centros de formação; o trabalho com crianças,  adolescentes  e  jovens  é altamente  complexo  e  exige  conhecimento  profundo.  É  claro que  a  pró-atividade,  a  facilidade no  relacionamento  com  este  público e a paixão pelo esporte são pré-requisitos,  porém  eles  são inerentes. O conhecimento científico-metodológico  deve  ser  o carro-chefe  dentro  deste  processo,  tais  qualidades  só  se  fazem eficazes  quando  acompanhadas da instrução correta.

O  que  o  país  precisa então  para  ser  o  que  almeja  naquilo que se relaciona à formação de  profissionais  formadores  de atletas? Simões nos explica que a graduação  comum  na  área  de Esporte ou Educação Física é sim um pré-requisito para o cargo de treinador, no entanto, não é suficiente.  Centros  de  excelência  na formação  de  treinadores  para modalidades  específicas  seriam uma saída para o desenvolvimento  eficiente  de  atletas  olímpicos.

Cada  modalidade  apresenta  um amplo  repertório  motor  único  e complexo,  o  qual  para  ser  contemplado  plenamente  exige  de fato muito conhecimento científico  e  dedicação  única. O  Professor aponta que se observarmos os casos  de  sucesso  em  algumas modalidades  específicas  como  a natação,  por  exemplo,  os  atletas brasileiros  que  se  destacam  em jogos olímpicos passam por modelos  internacionais  de  treinamento,  como  é  o  caso  de  Cesar Cielo,  da  natação,  que  treinou nos Estados Unidos da América, isso  em  função  da  escassez  de centros nacionais de alta qualidade e que atendam os atletas desta modalidade.

Além  da  necessidade de  desenvolvimento  infraestrutural, portanto, o que é mais simples  de  se  observar  a  olhos nus;  precisamos  de  recursos  humanos  especializados.  Nosso costume e visões imediatistas não resolverão  nossas  dificuldades em  “produzir”  atletas  olímpicos.

Modalidades  singulares  como  o vôlei  ou  o  futebol  são  casos  à parte;  os  Jogos  Olímpicos  são compostos  por  diversas  práticas, e estas demandam um sistema de organização específico. A articulação  entre  as  diferentes  esferas do governo – municipal, estadual e  federal – é  fundamental para o desenvolvimento de modalidades não  populares  no  país,  que  em contrapartida  são  fontes  de  inúmeras  medalhas  para  nações olímpicas. Projetos de centros de formação,  tanto de  atletas,  como de  treinadores,  são  dependentes de uma “função” entre estas esferas.

Ao  indagarmos  o  Professor Simões sobre providências que  a  comunidade  acadêmica poderia tomar para que as necessidades  de  um  projeto  olímpico sejam  contempladas,  ele  nos responde  que,  primeiramente devemos  ganhar  proximidade  do governo,  não  importando  qual seja  o  canal  de  comunicação. O Ministério do Esporte deve prestar contas à população em relação ao desenvolvimento de projetos e sua implementação. A comunidade  acadêmica  possui  a  instrução necessária  para  acompanhá-los de  perto  e  avaliar  se  o  caminho está  sendo  trilhado  da  melhor  forma. O  conhecimento  específico  concernente  ao  desenvolvimento  das  competências  física, técnica, tática e emocional de um atleta ou de uma  equipe  compõe nossas  ferramentas  de  trabalho, além é claro das informações que possuímos  em  termos  organizacionais.

Nas palavras do professor:  “Nossa  função  é  cobrar. Do contrário  continuaremos  deixando  todo  o  trabalho  por  parte  do Comitê Olímpico  e das  confederações.  Teremos  então  aquele número  insignificante  de  medalhas; os Jogos  irão passar, e qual será o  legado que teremos? Convites  feitos  aos membros  do  governo  para  vir  à  Universidade  e nos  contar  como  anda  o  projeto olímpico,  assim  como  quem  são os  responsáveis  pela  sua  execução e como se desenvolve a política  do  Esporte  no  Brasil  são possíveis  meios  de  nos  inserirmos  na  história  destes  Jogos”.

Quem é do Esporte ou da Educação  Física  deve  liderar  os movimentos  ligados  a  este  fenômeno no  nosso  país;  responsabilidade profissional em caráter público é algo que ainda precisamos aprender, e se já aprendemos, devemos então  iniciar  a  intervenção.  O Brasil  ainda  é  dependente  de estruturações  de  base;  é  praticamente  uma  certeza  que  gastaremos bilhões de reais provenientes do  dinheiro  público  na  corrida para a preparação inevitavelmente “às pressas” para os Jogos. Por que todo este investimento não é direcionado  a  aspectos  que  devem  receber  as  primeiras  atenções de  qualquer  país  que  pense conscientemente  no  futuro  olímpico?  Já  temos  escolas  suficientes?  Já  temos  políticas  administrativas  que  prezem  a  formação de  atletas  olímpicos  e  que  lhes dêem  suporte  para  chegar  ao pódio? Já temos diversos centros de  excelência  nas  mais  tradicionais  modalidades  olímpicas?
Infelizmente este é o nosso cenário  real. O  que nos  cabe,  talvez, seja atuar de forma responsável e consciente  para  fazer  com  que tudo  que  se  encontra  dentro  das possibilidades  do  tempo  e  das condições  presentes  seja  realmente  feito.  Por  enquanto,  o Brasil é apenas – desde que haja responsabilidade  e  iniciativa  – uma potencial nação olímpica.

O  PETELECO  agradece  a  importante  e  enriquecedora conversa  com  o  Professor Antônio Carlos Simões. 

 

 

 

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